Um misantropo, no demais modelo de todas as virtudes, tinha pela sua gata um amor exclusivo; achava-a bonita, engraçada, mansinha, e por fim, o que no sexo dela é raríssimo, tão discreta quão fiel e agradecida. Ah! se houvesse uma mulher como esta gatinha, dizia, ou se dado me fosse transformar em mulher este mimo dos animais, então acharia uma companheira com quem atravessasse o mar tempestuoso da vida! Condoeu-se dele uma fada, e cedendo a seus votos, transformou a gata em moça. Confuso pelo milagre, o nosso homem deu-se por feliz em poder naquele dia mesmo ir aos pés dos altares dar a mão de esposo a essa bela mulher.
Gata-moça e misantropo estavam nas nuvens, e este repetia àquela mil lições e mil conselhos, que ela, multiplicando-lhe afagos e carinhos, ouvia atentíssima. Subitamente, faz-lhe ela sinal que se cale, inclina a cabeça; é toda atenção; dá ligeira um pulo, e agarra um ratinho que travesso saíra do seu buraco. O instinto havia falado: a mulher era gata.
MORALIDADE: Por mais que procuremos vencer a nossa índole, sempre ela aí volta inesperada; fechai-lhe a porta, e entra pela janela.
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